sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Alcoolismo hoje.

O consumo de álcool está engessado no comportamento humano por diversos fatores histórico-culturais. Quase todas as sociedades, por mais afastadas que estivessem entre si, tanto geográfica quanto temporalmente, desenvolveram alguma forma de ópio para facilitarem o enfrentamento de suas frustrações ou regar suas celebrações.

Durante o Império romano, os imperadores e boa parte da população, principalmente os que ocupavam lugar de destaque, consumiam álcool amiúde, tanto ou mais que água. Em função disso, passagens épicas como a de Nero pondo fogo em Roma, são hoje pensadas como uma consequência direta ou indireta do excessivo consumo de álcool que, à época, continha um tóxico empregado para a conservação da bebida, o qual produzia efeitos psico-neurológicos consideráveis e permanentes; além disso, muitos dos vasilhames utilizados para consumir ou armazenar vinho eram criados em materiais igualmente tóxicos, como o chumbo.

Entretanto, hoje os tempos são outros e, de posse de um vasto conhecimento científico, a sociedade remodelou os modos de produção e consumo de bebidas, a pesar de mantê-lo, em diversos casos, tal como o faziam os romanos.

Ainda hoje muitas pessoas com problemas de ordem social, financeira, sentimental, etc., utilizam-se não somente da bebida, como também de outras drogas, para se refugiarem da realidade. O álcool serve-lhes como que um anestésico à dor das frustrações, dos medos; um sistema de polias ao peso das responsabilidades inerentes ao ato de viver. Assim, tais indivíduos vão afastando-se não apenas do enfrentamento dos fatos como também dos seus. Em diversos casos, como exemplificado no livro de Andréa Ilha, o vício dos pais compromete a saúde das relações familiares em um nível tão sério que os filhos e mesmo outros membros da família passam a ser afetados.

Hoje, contudo, cada vez mais cedo os jovens iniciam-se à vida “boêmia”, talvez por um efeito de pressão social, onde os que fazem uso da bebida, dentre outros, são mais bem aceitos.

Além disso, há ainda a apologia midiática: comumente veem-se propagandas de cervejarias onde o consumo do produto torna um indivíduo, a princípio ignorado e desinteressante a certo grupo “popular”, subitamente “descolado” e atraente – nisso entra também o apelo sexual, onde belas modelos com pouca roupa são utilizadas como que o “prêmio” pelo consumo da bebida.

Mas a verdade é que a coisa não é bem assim. Ademais de causar grave dependência, o álcool conduz a enfermidades muitas vezes irreversíveis, tal como a cirrose, sendo inclusive um dos principais protagonistas de acidentes automobilísticos fatais, como no caso dos pais da protagonista de “A menina que veio de longe”, Dulcinéa, cuja vida começavam por ordenar.


Desta maneira, compreende-se que atualmente o alcoolismo constitui-se um problema social que, apesar do reconhecimento, é apoiado de certa maneira pela mídia, uma vez que seja uma fonte de lucro bastante atrativa, sobretudo às cervejarias e às instituições por elas financiadas. Parece, porquanto, um pouco intangível extirpar do étos social o prazer pela bebida, sendo, por conseguinte, necessário por parte do Estado e das próprias famílias conscientizar os jovens quanto ao uso do álcool e empreender na ajuda àqueles que dele fizeram-se reféns.

Farias, M.S.: "Alcoolismo hoje". Dezembro de 2013.
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