Meus óculos estão inteiros.
Pode parecer não haver nenhum
sentido nessa afirmação. E não há. Não sem um contexto.
Quando meus escritos faziam
sentido ou quando havia girassóis no meu jardim, meus óculos eram quebrados e
arranhados. Tudo quanto eu via era intenso a meu modo. Tudo que sentia era
incomensurável. Então tudo se fundia,
criava vida, contorcia-se, invadia e arranhava. Sentir era grande e falar era
desnecessário. Eu só fazia girar e morrer, girar e morrer, fugir... Nos vais e
vens dos passos, meus óculos já cansados, atiravam-se a esmo. Tudo parava. O
mundo não era nada sem que eu pudesse ver.
Hoje meus óculos estão inteiros.
E quanto mais eu enxergo do mundo mais quero deixar de ver.
Sim, hoje vejo novo mundo. Mas não devo isto a
antigas experiências ou mesmo ao amor. Devo sim, ao meu novo óculos, que me
trouxe paisagens mais que lindas e fins de tarde seguros. Aos meus óculos
também devo o futuro desta vida, o futuro que então seria perdido por mim entre
as ruelas desta cidade mesquinha, a ele devo a minha casa de amanhã, os meus
sonhos de jovem escritora, devo meus contos impertinentes, a ele devo até minha
audição mais do que boa, pois se enxergo bem por que escutaria mal?
Agradeço-te meu querido, por ocultar os demônios visíveis, e se os
pesadelos não acabaram é por que não é hora, mas se acabarão um dia. Obrigada
por me devolver os dias nublados e por desfazer os nublados de meus dias.
É quase epifânico perceber que apenas a visão
rege o que sou ou que me tornei. Como se em todos os anos de minha vida o único
sentido que fez pesar-se tenha sido ela. Como se a falta de olhos mudasse-me,
fizesse-me mais transitiva, mais pessoal.
Uma vez li que nada é tão intransitivo quanto à chuva. Nada é tão
completo por si só. Por isso as pessoas não chovem! Ninguém pode tornar-se chuva. Pessoas são metades sempre a procura de algo
que as complete. Não há nada tão autodestrutivo do que abster-se quando se é
intemperante, não é vitorioso – mas é moral! – torna sofrido o que deveria ser
agradável e te devora...
Farias, Maikéle. "Uma prévia
do que virá...". Junho de 2013. http://livredialogo.blogspot.com.br/
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