quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Resenha analítica de o "Inventário de valores organizacionais"


TAMAYO, Álvaro; MENDES, Ana Magnólia; DA PAZ, Maria das Graças. Inventário de valores organizacionais. Psicologia, UnB, Brasília, DF, 2000, 27 p.

A produtividade de uma empresa está associada a diversos fatores compreendidos em sua Cultura Organizacional, a qual adota por base um conjunto de valores que regem o quotidiano da organização. Contudo, a existência de diferentes modelos mentais implica compreensões distintas de tais valores pelos indivíduos, podendo causar incompatibilidades e conflitos danosos à empresa e a seus funcionários. Nesse sentido, a Psicologia Organizacional, hodierno, dedica grande atenção à supracitada cultura, empenhando-se em construir modelos estratégicos, sobretudo na área de recursos humanos, que permitam atender com maior eficiência e eficácia as necessidades sócio-institucionais relacionadas à sobrevivência e bem-estar das organizações.

Os pesquisadores adotaram três conjuntos de perspectivas bipolares para representar os valores organizacionais: (a) autonomia versus conservadorismo, (b) hierarquia versus igualitarismo, (c) domínio versus harmonia. Um instrumento composto por 36 itens foi aplicado a uma amostra de 1.010 empregados, com idade média de 38,82 anos, de ambos os sexos, provenientes de cinco organizações do Distrito Federal, os quais se voluntariaram para o estudo. 12% dos participantes ocupavam cargos de gerência. A abordagem proposta consistia em estudar os valores organizacionais a partir da percepção que os empregados têm dos valores existentes e praticados na sua empresa.

Cada empresa possui um determinado perfil – algumas mais mecanicistas, outras com sistemas mais orgânicos. Mesmo nos diversos departamentos de uma mesma organização podem existir diferentes climas de trabalho, rotinas, costumes, usos, valores etc., que são determinantes para o desempenho de cada empregado, à sua satisfação no trabalho e, consequentemente, à produtividade da empresa.
Uma organização é constituída não propriamente pelos seus componentes físicos, e sim pelo seu próprio funcionamento, isto é, “a função dita à forma”: cada tarefa, cada cargo pressupõe um papel a ser desempenhado pelo funcionário, criando assim expectativas de comportamento que acabam por se converter em exigências, as quais sendo valorizadas e compartilhadas pelo grupo tornam-se valores inerentes à função – um bom exemplo é imaginarmos um servidor que cuida da manutenção terminar o expediente e ir até o bar frente à organização tomar um copo de cachaça, um fato sem qualquer relevância, mas, por outro lado, se esse servidor for o presidente dessa organização instantaneamente repercutirá.
Isso ocorre porque todo membro é capaz de desenvolver uma visão mais ou menos clara dos papeis e dos valores que predominam em sua organização e essa visão, certa ou errada, orienta o seu comportamento. Daí a importância dos valores na elaboração dos perfis culturais das organizações: eles são o alicerce; os valores funcionam como padrões para o julgamento e a justificação do comportamento de si e dos outros.
A forma como o indivíduo percebe e se relaciona com a realidade organizacional constitui o aspecto cognitivo fundamental através do qual ele desenvolve as suas crenças acerca dos múltiplos aspectos da vida organizacional. Em geral, os valores em uma organização expressam os interesses e os desejos de alguém – o fundador, o dono, o presidente –, ou de um grupo de membros da empresa, afigurando-se como uma consciência mais ou menos clara das metas organizacionais.
Cada cultura organizacional pressupõe, também, certa hierarquia de valores, a fim de evitar a dissonância dos diferentes modelos mentais existentes entre os componentes da organização. Cada indivíduo possui um entendimento subjetivo do mundo real, e esse entendimento age sobre a sua forma de perceber os valores da organização, o que, por sua vez, poderá causar incompatibilidades e conflitos com colegas e mesmo com os gerentes acerca, por exemplo, da execução das tarefas. Isso ocorre, fundamentalmente, porque a percepção do grau de importância daquilo que será considerado primário ou secundário será relativo à hierarquia dos valores e à representação mental da organização que o indivíduo cria.
Desta forma, tal como as sociedades e os indivíduos, as organizações se deparam com exigências universais que devem ser satisfeitas para garantir a sua sobrevivência, criando, como resposta, padrões de comportamento e valores que orientem a sua vida quotidiana.
Assim, os valores são capazes de aliar os empregados em relação a um objetivo, fazendo com que permaneçam dentro da estratégia, desempenhando seus papeis adequadamente. Neste sentido, os valores constituem-se no delineamento da estrutura da organização, pois eles caracterizarão a maneira de pensar, agir e mesmo de sentir dos funcionários, definindo o quotidiano, a vida na empresa. As próprias normas são uma espécie de instrumentalização desses valores, formas de “estimular”, ou melhor, determinar padrões de comportamento.
O inventário de valores constatou que no Brasil, à exceção da perspectiva “hierarquia versus igualitarismo”, os valores associados a todas as outras conseguem coexistir no ambiente organizacional.

De fato, não são poucos os casos de que se encontra registro em fontes confiáveis, na internet, de ações judiciais envolvendo demissões relacionadas a conflitos entre empregados e chefias com termos como “incompatibilidade de gênio”, ou reclamações no sentindo de limitação da iniciativa e desprestígio do indivíduo. São diversas as queixas e a terminologia, mas todos compartem de um mesmo princípio: a divergência de valores. Esses conflitos são bastante perniciosos à organização, pois afetam a produtividade e demandam custos, quer seja com o processo de demissão, quer seja com o processo de seleção de novos funcionários. Destarde faz-se imperioso que as organizações reservem maior atenção ao desenvolvimento de um perfil cultural organizacional alinhado aos valores ligados ao bom desempenho de suas atividades, considerando certa margem para a subjetividade dos membros: é preciso papeis, normas, subsistemas organizacionais e estratégias de trabalho bem definidos e claros. Como inferido pelo Inventário, há no Brasil uma particularidade muito profícua: a maioria das perspectivas tradicionalmente conflitantes consegue coexistir de forma saudável, proporcionando ambientes de trabalho satisfatórios à empresa e aos empregados. A compreensão de suas próprias culturas também permite à organização estabelecer um melhor relacionamento com o meio natural e social no qual está inserta, além de maior precisão na identificação da necessidade de mudança, onde e como, da mesma forma que as causas de resistência à mudança.

O artigo é um material bastante interessante, embora um tanto complexo, para ser estudado com tempo e profundidade, pois permite inúmeras inferências sobre o quão importante é o papel dos valores pessoais e culturais em relação à organização, como também os valores da própria, relacionados à sua natureza, missão e objetivos. Possui um alto valor pedagógico ao salientar a complexidade das relações humanas e institucionais. Permite, ainda, aos acadêmicos e gestores, avaliarem os tipos motivacionais em dois níveis diferentes – o dos valores reais, ou seja, aqueles que na percepção dos empregados são realmente praticados na empresa, e os desejados, que designa o grau de importância ou prioridade que os empregados gostariam que fosse dada a cada um dos valores apresentados.

Álvaro Tamayo, doutor em Psicologia Social pela Université de Louvain, Bélgica, é professor titular da Universidade de Brasília; Ana Magnólia Mendes, é doutora em Psicologia Organizacional pela Universidade de Brasília, é professora adjunta da Universidade de Brasília; Maria das Graças T. Da Paz, doutora em Psicologia Organizacional pela Universidade de Brasília, é diretoria do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília.

Farias, M. S. "Resenha analítica de o 'Inventário de valores organizacionais'". Dezembro de 2014. http://livredialogo.blogspot.com.br/
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