quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Olhos negros desconcertantes - Parte 7

                                                                           
 7.


               Meses. Passaram-se meses em que eu não tivera notícias de Petrus. Meses!

Outubro sempre me pareceu um mês incrivelmente entediante em todos os pontos.  O clima era ameno e tudo se fazia mediano, pela metade. Irritante! Antônio dissera-me, alguma vez, que mulheres não deviam portar-se deste modo em que eu me portava, “fortes demais”, "donas de si”. Acertei-lhe um vaso de flores no meio da testa. Nunca mais voltamos a este assunto.  “Mas com Madalena é oito ou oitenta, nada de meios termos” era o que vovó costumava dizer. Certa estava ela. Ou nem tanto...

Petrus...

Tornei a voltar para casa depois de mais um dia de trabalho. Abri a porta e me deparei com as malditas correspondências no chão da sala. Juntei uma por uma até que uma delas chamou minha atenção. Um envelope de cor marrom, algo que eu jamais havia visto antes. Sem remente. Apenas manchas e mais manchas que cobriam mais parte da cor. Manchas que em um tempo não muito distante deveriam ter sido palavras. Encostei-me à porta. Inicialmente, me apressei a tentar decifrar os rabiscos daquele manuscrito. Quem o teria escrito?

“Olá minha querida.

Talvez não aprecies a chegada desta carta só neste instante. Faz algum tempo desde que o clima era mais convidativo, não é mesmo? Outubro. Oh, tempo terrível... Mas não foi para falar-lhe sobre isto que escrevi. Tu não sabes, mas naquela noite, no nosso ultimo encontro, (lembra-se?), quem fugiu não foi somente eu! Sei que teme o negro de meus olhos... Será que não percebes que é teu reflexo que se faz e se aloja em meu olhar? Que toda esta “escuridão” que tu pensas ver dentro de mim é a falta de luz na tua alma? Por isso és treva. Mas eu queria tanto ser tua luz, tanto...

Justificando ainda mais meu desaparecimento, digo-te: Quem pôde algum dia fugir de ti? Ninguém! Jamais! Quem dá-se ao luxo de temer aquela sombra do final rua? Quem se faz tão doido de correr do escuro à noite? Mesmo que fizéssemos nada adiantaria. O mal também é parte da vida. Só quero recomendar-lhe: as trevas nunca ganharam guerra pelo menos não sozinhas. Se quiseres ajuda, querida, não hesite em me procurar! Serei um bom servo e guerreiro. Encontre-me... (Vai em anexo meu endereço de férias)”.

- Maldito!

No fim da semana, enquanto rumava para o endereço de Petrus, não pensava e não planejava o que iria ou poderia acontecer, mas quando cheguei à frente do endereço senti um misto de curiosidade e medo. Era uma casa de campo imensa e muito bonita o que me deixava ainda mais amedrontada. Na realidade não conhecia Petrus e, mesmo que quisesse, não sabia decifrá-lo. Não como ele havia feito comigo. Recuei alguns passos quando decidi voltar para a segurança de meu lar, mas quando dava as costas para a casa a porta abriu-se com um ruído característico de casas mal assombradas de filmes de terror. Uma mulher de estatura mediana, um olhar penetrante e meticuloso olhava-me na soleira da varanda.

- Vai ficar parada aí menina? Entra logo! O Sr. Greet está a sua espera. Ande, ande...

Não havia mais como fugir. Obriguei-me a subir os degraus que se encontravam antes da porta principal e que me separavam da companhia da mulher. Quando terminei de subir as escadas e me encontrar em frente à porta foi que percebi que terminara de saber algo mais sobre Petrus. PetrusGreet!

- Sou Madal...

- Já sei, já sei. Sou senhorita Blair, a governanta. – Ela falava com um tom decidido que fazia qualquer um acreditar que ser governanta era um trabalho muito mais valioso do que era realmente. Depois que, todas as “Blair’s” que conheci tanto as reais quanto as de lendas e fantasia, eram completas bruxas.

- Petrus... Petrus está? – perguntei.

Senhorita Blair apenas soltou um grunhido de desdém e me apontou a escada logo a minha frente. Pegou minhas malas e retirou-se rapidamente pelo corredor que se estendia ao nosso lado. Esperei até não conseguir mais vê-la através do corredor, então, tentando demonstrar segurança em meus passos, subi a escada até poder ver todo o segundo andar da casa. Logo fiquei em dúvida sobre qual dos cômodos deveria entrar. Havia três portas a minha esquerda, uma em minha frente e mais duas na direita. Optei pela porta a minha frente, girei a maçaneta, mas quando a abria ouvi um ruído a minha esquerda. Um barulho quase imperceptível. Soltei a maçaneta e caminhei até o fim do corredor esquerdo onde havia uma janela que estava voltada para os fundos da propriedade. Um lago estendia-se calmo logo atrás de algumas árvores.

Realmente era uma bela casa de férias. Segurei a janela e tentei empurrá-la para ficasse totalmente aberta e eu pudesse vislumbrar melhor o lago. Estava emperrada! Mas fiquei obstinada a tentar abri-la com todas as minhas forças. Empurrei muitas e muitas vezes até quando ia desistir a janela abriu-se num estrondo ensurdecedor que fez com que eu a soltasse perdendo todo o esforço que havia feito. Foi quando, com raiva, tentei fazê-la subir de qualquer maneira e no meu total desconhecimento do poder da janela, escorreguei para fora da casa e fiquei suspensa apenas me segurando com uma das mãos na madeira da janela. Tentei ser racional e pensar no que fazer. Senhorita Blair não me escutaria gritar já que se encontrava no lado oposto da casa. Não queria olhar pra baixo, mas decidi fazê-lo; caindo dali o estrago seria bem grande. Se saísse viva, metade do meu corpo ficaria quebrado. Comecei a perder força no braço e como não havia pensado em nada que pudesse livrar dessa decidi que só poderia gritar. Então gritei, gritei e gritei o mais alto que pude. Minha mão já estava escorregadia e meu braço não aguentava o peso de todo meu corpo, menos ainda depois de todo esforço que fiz com a janela. “Não acredito que vou morrer assim!”.   Não tinha mais forças para segurar então fui soltando a mão devagar. Quando terminei de fazê-la e estava pronta para despencar e quebrar maioria dos meus ossos (ou morrer!) uma mão forte segurou meu braço me puxando pela janela para dentro da casa novamente.

- Olá querida! – Foi a ultima coisa que escutei...

Farias, Maikéle. "Olhos negros desconcertantes - Parte 7". Agosto de 2012. http://livredialogo.blogspot.com.br/
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